Por Marcelo Quinzani*
Nesta semana tivemos contato com a primeira notícia sobre um cão supostamente infectado com o vírus Ebola. O caso aconteceu na Espanha, onde um animal de propriedade de uma enfermeira espanhola com a doença teve que ser eutanasiado, causando muita consternação e preocupação com a possibilidade de animais domésticos participarem da disseminação do vírus.
Como se trata de uma doença emergente, há muitas dúvidas que podem gerar medo e medidas precipitadas. A desinformação é o maior perigo na disseminação da maioria das doenças.
Existe uma preocupação com os cães e outros animais domésticos no papel de transmissores do vírus, mas somente em regiões endêmicas da África. No atual cenário mundial da doença, a probabilidade de um cão fora da África, inclusive no Brasil, transmitir o vírus é muito remota, pois existiria a necessidade de contato direto com pessoas infectadas ou com sintomas do Ebola.
Apesar de existirem evidências de que os cães podem ser infectados, não há nenhum indício de que eles possam desenvolver a doença. Segundo pesquisadores da Universidade de Guelph, em Ontario (Canadá), um estudo com cães em uma comunidade na África, onde um surto do vírus Ebola estava em andamento, 27% dos cães saudáveis tinham anticorpos séricos contra o vírus (ou seja, tiveram contato com o vírus Ebola), mas nenhum tinha o vírus detectável em circulação.
Sinais de exposição ao vírus não surpreendem, pois o contato dos cães com os humanos é muito íntimo e provavelmente um cão de uma pessoa com Ebola tenha contato direto com secreções corpóreas contendo o vírus. Mas independentemente do fato de cães terem sido expostos à doença, não há atualmente nenhuma evidência de que animais infectados podem disseminá-la.
No caso muito improvável de um cão de estimação brasileiro ter contato com uma pessoa com suspeita de Ebola, os serviços públicos de saúde, incluindo veterinários, devem investigar todos os contactantes e isolar esse animal em quarentena.
Acreditamos que esforços coordenados estão em andamento para desenvolver orientações para a gestão dos cães expostos a indivíduos com infecção pelo vírus Ebola em todo o mundo.
A falta de informação sobre a contaminação de cães pelo vírus torna difícil o desenvolvimento de práticas baseadas em evidências. No entanto, dada a informação disponível sobre o vírus Ebola em cães, recomendações podem ser desenvolvidas para o evento, mesmo diante da baixa probabilidade de que cães ou outros animais de estimação expostos à doença sejam, a partir daí, uma fonte de preocupação no controle e disseminação da mesma.
Mesmo assim, preocupações sobre cães e vírus Ebola não podem ser descartadas e muito menos subestimadas. Elas devem fazer parte de todos os esforços para promover o controle da doença e conter sua disseminação entre os continentes.
*Marcelo Quinzani é médico veterinário e diretor clínico do Hospital Veterinário Pet Care.